Aqui é onde a terra se despe
e o tempo se deita..

(Mia Couto, A Varanda do Frangipani)

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Literal(mente)


Entro e fecho a porta, não tenho chaves.
Deito. Não durmo e o livro me basta. Agora sou outra história.
Outro lugar. 
Qualquer lugar longe daqui.

Moro nesse livro que me abriga e afago essas letras.
Fico à margem de mim, sou apenas as bordas do eu que está lá fora.
Não sou quem escreve. Sou quem lê.
A textura de cada página. O cheiro.

Piso em paisagens bucólicas e vejo céus invernais.
Sempre é mais bonito o inverno. Alguns outonos cabem.
Poucas cores. Quase sempre chove. 
Um tempo bom.

Mentiras literárias.
A melancolia não gosta de portas abertas.





Um fio, um nó



E remenda
e tenta
e arruma
Alinha.

E ata
até o que não é de atar.

E costura
o que rasga
o que esgaça
Retalha.

E guarda
até o que não é de guardar.

E enfeita
ou desfaz
ou amassa
Esquece.






Que lugar é esse?




Sobrou um espaço sem palavras, letras avulsas saltam como soluços entre um café e outro. Algumas frases reféns de um invento fora de lugar caem sobre o papel e dançam meio que sem graça jogadas assim sem nem mesmo a coerência de uma vírgula. Um verso vazio em meio às folhas secas e as palavras correm em uma outra direção. Folhas caídas, letras submersas em uma calma que não é daqui. Não amanhece nunca.





Longe daqui choveu.

E não nos molharemos
 não juntos
não pela mesma nuvem
não no mesmo tempo.

É sempre muito longe quando chove.