Aqui é onde a terra se despe
e o tempo se deita..

(Mia Couto, A Varanda do Frangipani)

domingo, 31 de março de 2013

É que Adeus é uma palavra grande demais




No fundo eu sabia que com a mudança da estação e a chegada dos dias mais frios o enveludamento dos recentes sentimentos finalmente poderia ser traduzido em letras.

Penso que deves estar pintando as paredes da sala agora, cores claras e  enquanto providenciavas uma lâmpada provavelmente tenhas pensando em nós, na verdade tive receio de que simplesmente a tenhas trocado, sem lembrança alguma. Esse me é um sentimento bastante forte. O esquecimento, ou a insignificância de tudo que planejamos.

Nos sonhamos tantas vezes; ainda parece o mesmo tempo; ainda parece termos o tempo que nos demos. Tudo parece intacto. Não nos vivemos.

Talvez não estejas pintando a parede de uma cor clara, pode ser que tudo estivesse do teu agrado e nada tenha sido mudado. Acho que não saberei. Imaginei um piso de parquet, quase consigo te sentir.

Continuo usando fones, mesmo sem música; Ainda existe algo de ti nos tons das madrugadas. Muita coisa sobrevive ao que acaba.

Mas acabar não é  verbo bonito. 




sexta-feira, 22 de março de 2013

Sobre o vento


Os vaga-lumes pareciam ter se apagado. A noite era densa. O frio que vinha de longe trazia também areia aos olhos. Era preciso lembrar que casacos vestiam cabides inertes e óculos curavam cegueiras imaginárias. Era uma conjugação passada. Tarde agora; ou estaria errado. Deveria ser presente; foi passado. Foi distante. Foi só, nunca esteve; passou. ( Inconstante ). 


sexta-feira, 15 de março de 2013

Embonitecer


Nos ensinaram que a felicidade deve ser nossa parte visível, que a alegria é para ser mostrada. Nos ensinaram que somos mais bonitos ao sorrir e ao demonstrarmos contentamento. E o contrário disso, a fragilidade é para ser mantida somente conosco. 

Acho que mentiram.

Fomos condicionados a acreditar que sendo aparentemente alegres, as outras pessoas nos amariam mais. Que ao demonstrar  fraquezas e falhas, nossos medos e frustrações seriamos de alguma forma rejeitados. Como se a alegria não fosse apenas um estado de espirito coexistindo com uma série de outros sentimentos tão importantes e reais quanto a própria felicidade.

E não somos de alguma forma encantadores quando nos mostramos humanos, frágeis e sem maquiagens? Talvez não seja realmente nosso melhor ângulo, mas quem pode  apaixonar-se por um sorriso estático? Quem ama o que nunca muda? 

 A vulnerabilidade pode ser surpreendente. De repente acontece de sentir dor, de errar, precisar de ajuda, mostrar que é feito de uma alma por entre os ossos. E assim aparece um lado belo, um belo autêntico, sem plasticidades, sem ensaios. 

Falta rosto sorrindo de cara limpa, falta o riso e a risada que ficam contidos no sorriso. Falta deixar cair a lágrima quando a emoção toma conta do ser. Falta voltar a acreditar na importância de um pouco de silêncio suportável entre duas pessoas. 


Falta embonitecer. 

( Pintaram a paixão de vermelho, concordo que seja um clássico, mas os amarelos estão tão suculentos. Amarelo manga, maracujá; E é gostoso não é? Mesmo sem paixão, assim puro amarelo, com o toque ácido, nunca é só doce. Amarelo laranja madura. )












Silêncios






terça-feira, 12 de março de 2013

A indiferença dos dias iguais


Os relógios não giram na madrugada, ficam fixos olhando os movimentos dos insones. Repetições. Uma noite funda, marcas nos rostos. Passos no assoalho velho, estalos. Cenários com cortinas abaixadas, grossas, espetáculo por dentro. É uma demora e talvez seja apenas um não ter o que esperar das manhãs. Não sentir quando o dia chega, não sentir o dia. Sem desculpas, longos. Vertigem. Quando não tenho bolsos fico sem saber o que fazer com as mãos, falta abrigo. A chave não tranca a porta, nunca é seguro. Quanto tempo será necessário dormir para acordar e não ser mais hoje?